Tal Pai, Tal Filho (Lucas Andries, 2019)
por Egberto Santana Nunes
Talvez seja exagero afirmar que se não fosse pelos marcadores de tempo expostos nas imagens de Tal Pai, Tal Filho, o curta de Lucas Andries estaria preso num limbo temporal. As brincadeiras universais que resistem na história e as reuniões convencionais de famílias comuns resistem aos letreiros. A forma fantasmagórica do próprio diretor em poucos segundos da montagem vai sustentar a temporalidade atual. O digital também colabora e, claro, o voice-over de Andries explicitando sua narrativa nos coloca de volta o tempo todo para o presente.
O conflito temporal é proporcionado pela voz e pela imagem e causa o impacto que perdura e completa os 10 minutos do resgate da relação entre pai e filho que o curta entrega. O VHS não somente é tirado do lugar – histórico, físico e imaginado -, como também é reposicionado pela montagem. Isso garante uma identificação universal, indo e voltando no mesmo espaço, em certo aspecto ficcional próximo de quem assiste. Por sua vez, o áudio não é alterado, apenas entra em diálogo com o presente. Cria-se então uma linha, onde a caminhada vai ser guiada pelas alterações formais impostas. Um retorno ao passado realizado por uma tecnologia do presente é então equilibrado.
O convite para essa caminhada é feito sem muita explicação, como se fôssemos transportados por uma máquina do tempo. Ainda que Andries explicite suas intenções, a filmagem do pai é inserida logo no início e a gente se acostuma. Se lembrarmos que a inserção dos elementos da vinheta de abertura e encerramento são rolos de filmes, a viagem é ainda maior. Os irmãos Lumière, pioneiros do cinema, e suas filmagens caseiras familiares dos anos 20, encontram seus semelhantes, e ainda, com o digital e a voz poética mineira, se perdem no caminho. Ainda na França de séculos passados, Melière iria levar sua profissão de mágico para a tela, com os primeiros efeitos especiais do cinema. De certa forma, Andries também brinca com a ilusão em seu curta. Ele se teletransporta, e a gente nem vê, apenas sentimos.
Tal feito é permitido justamente pela negação do uso exacerbado de efeitos “especiais” do digital, deixando o arquivo fluir pela imagem, e o ingresso na ideia do transparecer através da narração. A voz identificável é do próprio viajante, que destoa do chiado antigo do pai das filmagens. A resposta da voz principal nos traz de volta para o presente. Mais significativo ainda é quando o diretor escolhe os momentos da ligação para sobreviver junto às filmagens das brincadeiras entre pai e filho ou no primeiro toque na barriga da mãe. Diálogos temporais.
A exploração da recusa continua ainda por uma voz desconhecida, que não consegue pausar a imagem da gravação, fazendo um flash preto típico de televisões antigas ir e sumir da tela. O pause é renegado pela própria câmera ou pela dificuldade de quem opera em cancelar o filme. Não sabemos. O que importa é que ali foi resistido o gesto por um desses meios. Portanto, a recusa sem identificação, no passado, encurtou a distância reconhecida por Andries, agora no presente.